Você conhece o blockchain Corda?
Se você respondeu sim a esta pergunta, há chances que você tenha entrado nesse artigo só para postar nos comentários que Corda não é um blockchain, e sim um DLT (Distributed Ledger Technology). De fato, a arquitetura do Corda é bastante diferente dos blockchains “tradicionais” como o Ethereum e Hyperledger Fabric. Entretanto, enquanto o grupo da ISO não definir exatamente o que significa o termo “blockchain”, podemos continuar usando-o sem temor. Por outro lado concordo que estamos falando de um blockchain sem block nem chain…
O Corda, criado pela R3 em 2017, é normalmente tido como uma solução para o mercado financeiro. E não por acaso: ele nasceu para este propósito, mas acabou tendo uma abrangência muito maior, incluindo praticamente todas as verticais do mundo dos negócios.
O ecossistema da R3 já conta com mais de 200 membros. Isso inclui empresas de diversos setores, multinacionais e nacionais. Bradesco, Itaú e B3 garantem a presença do setor financeiro brasileiro.
Esse artigo visa dar uma visão rápida sobre alguns aspectos deste flavor de blockchain, podendo ser seu ponto de partida para se aprofundar nesta tecnologia.
Arquitetura
Alguns recursos técnicos adotados pelo Corda são realmente diferentes dos principais blockchains para uso corporativo. Destaco alguns destes recursos nos parágrafos abaixo.
O Bitcoin, assim como diversos outros blockchains, usam gossip protocols, enquanto o Corda usa need-to-know basis protocol. Traduzindo: o Corda não “fofoca” todas as transações para todos os membros da rede; ele as envia apenas para quem faz parte de cada transação. É a chamada privacy by design, se distanciando da visão clássica de que todos membros possuem uma cópia do ledger inteiro no seu nó.
Falando em Bitcoin, o Corda utiliza também o conceito de UTXO (unspent transaction output), onde cada transação consome um conjunto de estados (states) existentes para produzir um novo estado.
Nesta rede permissionada, após o nó ter sua entrada autorizada, um serviço de mapeamento de rede mantém a relação de todos os IPs dos participantes. Um serviço de cartório (notary service) executa a validação da transação e garante sua não-duplicidade. Serviços de oráculo (oracle services) permitem o acesso a informações externas ao sistema.
O lema “Code is law”, tradicional no mundo dos Smart Contracts, não se aplica aos contratos em Corda. Primeiro porque o contrato pode sim ter seu código atualizado. E segundo porque existe o “legal prose” que pode ser um contrato do mundo real (em PDF por exemplo) anexo ao código (programa) original, quando este não for suficiente para sanar eventuais disputas que possam surgir.
É possível também você restringir a execução da sua transação a uma certa janela de tempo (time-window). Determinada transação pode fazer sentido apenas se executada até certa data/horário, a partir de tal momento, ou num certo intervalo de tempo, como por exemplo, em um certo dia.
Visando ter o nível máximo de privacidade, a rede pretende utilizar a tecnologia Zero knowledge proof, implementada através do zkSNARK
Já em outros aspectos, o Corda optou por soluções consagradas, usando a JVM para rodar o código, bancos de dados relacionais SQL, e implementações comuns para gerenciamento de filas de mensagens.
Informação compartilhada só entre quem faz parte da transação
Onde encontrar
A versão open-source do Corda pode ser obtida diretamente do seu repositório no Github.
Para quem não quer mergulhar tão profundamente no mundo técnico, é recomendado usá-lo através de clouds, como no AWS e no marketplace do Microsoft Azure. Aproveite para integrar seu dApp (na verdade, seu “CordApp”) com as diversas outras ferramentas disponíveis nestes ambientes.
Mantenha-se atualizado
Acompanhar um software que está em constante evolução não é tarefa das mais fáceis. Portanto listo alguns recursos interessantes para este fim.
Para se iniciar da maneira mais formal possível, leia o white paper.
Para uma documentação on-line em estilo amigável, incluindo vídeos embutidos, clique aqui.
Dê suas sugestões e siga as últimas tendências no fórum pelo grupo de Slack.
Quer verificar se sua dúvida já foi respondida por alguém? Cheque nas mais de mil perguntas no Stack Overflow.
Artigos muito bacanas no Medium.
O canal do YouTube é constantemente atualizado com vídeos didáticos e de eventos.
Os principais eventos são:
- Bootcamp – Treinamento técnico básico gratuito com duração de um dia
- CordaCon – Conferência anual que ocorre em Londres. Dura dois dias, com separação em trilha de negócios (BizDay) e desenvolvedores (DevDay)
- Meetups – Reuniões que acontecem esporadicamente em algumas cidades do mundo
Negócios
Apesar de ainda não serem muitos os cases em produção, já há iniciativas bastante interessantes no mercado.
Para aplicações corporativas, a versão Corda Enterprise se aplica melhor em relação à open-source. Ela é paga, mas inclui suporte de missão crítica do fabricante, integração com banco de dados Oracle e SQL-Server, interoperabilidade e segurança de alto nível.
A Finastra, gigante londrina em tecnologia financeira, criou o produto Loan-IQ. Através dele, ela conseguiu reunir cerca de 1.700 membros como bancos, clientes, financeiras, etc para possibilitar empréstimos sindicalizados entre eles.
O Blockchain Insurance Industry Initiative, conhecido como “B3i”, é uma iniciativa de colaboração da indústria de seguros. Reúne membros como Allianz, Liberty Mutual, Zurich e Swiss Re.
O processo de KYC passa por um piloto através da Synechron. São cerca de 40 empresas que podem dispor de um modelo soberano de identificação, evitando duplicidades, aumentando a privacidade e diminuindo falhas em todo o processo.
Tradewind é uma plataforma construída no cloud AWS para o mercado de ouro. O processo de investimento e comercialização dessa commodity foi simplificado, ficou mais transparente e abriu uma nova gama de oportunidades.
Aqui no Brasil temos um importante case da B3 com o Bradesco. O projeto visa simplificar o processo de registro de CDBs e ampliar a eficiência dos processos existentes.
Conclusão
O Corda é um blockchain que traz soluções técnicas realmente interessantes. Alicerçado por cerca de 200 empresas, ele vem ganhando tração em diversos mercados e desponta como uma das principais opções de blockchain corporativos.
Interessante ressaltar que o Brasil é um dos quatro países que possuem escritório da R3, junto com Nova Iorque, Singapura e Londres. Não deve ser à toa.
Marcelo Creimer
Blockchain | IoT | Cognitive